Opinião

Gentileza gera gentileza


Conhecido como "Profeta Gentileza", José Datrino, nos anos 1980, espalhava mensagens de bondade e amor pelos muros do Rio de Janeiro. Mais tarde, suas palavras foram cobertas com tinta cinza pela prefeitura do Rio que, posteriormente, se desculpou e restaurou os murais. O Profeta Gentileza foi muitas vezes tido como "maluco", ao que, prontamente, respondia: "Sou maluco para te amar e louco para te salvar". Ficou eternizado na voz de Marisa Monte através da música "Gentileza":

"Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
A palavra no muro
Ficou coberta de tinta...
...Nós que passamos apressados
Pelas ruas da cidade
Merecemos ler as letras
E as palavras de gentileza" 

José Datrino faleceu aos 79 anos, em 1996. Após sua morte, recebeu homenagem em escola de samba, foi amplamente debatido em espaços universitários e o lema "Gentileza gera Gentileza" é, até hoje, difundido em camisetas, quadros e, até mesmo, em imãs de geladeira.

Mas será que estamos, atualmente, refletindo sobre as delicadezas vivenciadas em nosso cotidiano? Percebemos as mensagens graciosas em nossos itinerários? Prestamos atenção no sorriso do(a) vendedor(a) ou identificamos rapidamente o defeito do produto comprado? Captamos a educação do(a) frentista do posto de gasolina ou ficamos irritados com o preço do combustível? Agradecemos o rapaz da tele-moto que rapidamente trouxe a nossa encomenda ou nos incomodamos porque o queijo da pizza encostou na tampa da embalagem? Elogiamos a comida do restaurante ou nos aborrecemos com os 10% do garçom? Será que estamos tão apressados que perdemos as oportunidades de observar os encantamentos diários?

Aproveite para refletir sobre quem dedicou palavras amorosas (não apenas nas redes sociais), gestos delicados, atitudes colaborativas por onde você passa. Retribua, preferencialmente, em dobro.

A pressa do dia a dia, geralmente, nos deixa mais disponíveis para exclamar as circunstâncias desagradáveis em nossas trajetórias: o dinheiro que mal chega até a metade do mês, o carro que enguiçou, ter sido mal interpretado pelo amigo, colega de trabalho ou familiar, entre outras tantas situações.

Passamos o tempo todo discutindo os buracos das ruas, a sinalização inadequada, a árvore de Natal sem graça, a quase inexistência de espaços para caminhadas e esportes e a iluminação deficiente das ruas. Enfim, as intermináveis queixas sobre como tem andado a nossa cidade. Sim, eu também reclamo. Principalmente o fechamento, quase completo, da Avenida Medianeira, fazendo eu dar voltas intermináveis para chegar ao trabalho.

Mas confesso que, ao passar em algumas ruas da nossa Santa Maria, visualizo poesias nos muros. E isso traz um pouco de esperança: a vida não está cinza. Repentinamente, lembramos de ouvir uma música no rádio, cantarolar qualquer som que vier na cabeça e abrir um sorriso. Pensar em alguém que traz (ou trouxe) felicidade em algum momento. Os pequenos (grandes) prazeres da vida! "Amor palavra que liberta, já dizia o poeta"!

Não sei quem é o(a) nosso(a) profeta. Na verdade, espero que sejam muitos(as). Que os muros ganhem, cada vez mais, muita leveza. Que consigamos sempre notar o gesto de elegância que vem do outro. E muito obrigada, poetas, sem vocês, o mundo não teria graça.


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